quinta-feira, 5 de julho de 2007

O essencial também se faz assim

Da candidatura de JA Barreiros ao Conselho Superior da Ordem dos Advogados....

Afirma-se no Estatuto que «o Conselho Superior é o supremo órgão jurisdicional da Ordem dos Advogados» e da mesma sorte que as candidaturas ao Conselho Superior da Ordem podem ser autónomas e independentes das listas que forem apresentadas para a eleição do Conselho Geral, presidido pelo Bastonário.

Isto é a lei. Só que na Ordem dos Advogados a prática viveu sempre aquém da lei.

Listas houve para o Conselho Superior, para os Conselhos Distritais e mesmo para os Conselhos de Deontologia, que se apresentaram a sufrágio em consonância com a lista do Bastonário, numa lógica de alinhamento e de convergência com a política do poder.

Houve tempos em que daí nenhum mal vinha ao mundo. Hoje há que mudar e o exemplo tem de partir de cima. Os novos tempos trouxeram novas exigências.

A Ordem não pode ficar à mercê da confusão entre quem manda e quem julga.

Os tempos que se vislumbram são de facto preocupantes e urge, face aos problemas complexos que se colocam, encontrar soluções que garantam uma plena e radical separação de poderes dentro da Ordem e a autonomia originária ao Conselho Superior.

O que está em causa para esta lista são três objectivos estratégicos.

Primeiro, salvar a ideia de Ordem, a sua independência face a todos os poderes, endógenos ou exógenos: independência ante o poder político, o económico, o próprio poder corporativo; salvar a sua autonomia face aos demais órgãos da Justiça, defender, enfim, a liberdade dos advogados que a integram, garantir com orgulho a sobrevivência de uma advocacia enquanto profissão liberal prestigiada e digna.

Segundo, garantir um sistema de autocontrolo pela legalidade das várias instâncias que na Ordem concorrem para que esta assegure a legítima e credível representação legal da classe, evitar que a curto prazo sejamos uma associação privada de socorros mútuos ou uma repartição administrativa do Ministério da Justiça.

Terceiro, tornar visível para a comunidade dos cidadãos que a Ordem constitui, pela exemplaridade do seu funcionamento, um instrumento de construção do Estado de Direito e um garante da cidadania.

Tempo de angústia, ambiente de desolação e de baixa expectativa quanto a um melhor futuro, eis o panorama actual na Advocacia, quase arriscaríamos dizer, na Justiça em geral. Não temos pior Advocacia do que temos Justiça.

É o tempo de uma advocacia secundarizada em muitos tribunais, uma advocacia que encontra na mercantilização da profissão uma forma de agir empresarialmente, onde a par da correcção e do aprumo, quantas vezes encontramos um mundo profissional em que cede por vezes a honorabilidade ao lucro fácil, a discrição profissional à mera vaidade pessoal.

É o tempo da exploração do trabalho dos jovens, de advogados sem causas, de uma Ordem em que os seus protagonistas explicam mediaticamente leis que, afinal, foram feitas à sua revelia e com o seu apoucamento.

A própria ideia de Ordem começa a ser hoje posta em causa pelos que julgam que face ao carácter supostamente antiquado do seu conceito, melhor seria ela substituída por uma sua versão post-moderna, inspirada em figurinos anglo-saxónicos.

Esquecem, porém, os que assim pensam, que um tal modelo não só não tem tradição nem significado útil no nosso ordenamento jurídico, como, e eis o veneno escondido, ele abre a porta a que o Estado, ante a privatização assim instituída, nos retire aquilo que é, no sistema constitucional de Justiça, a matriz constitutiva da noção de Ordem, o ser uma associação pública, independente dos órgãos do Estado e por isso livre e autónoma.

Além disso, ante a perplexidade que causam algumas decisões disciplinares e a falta delas em outras situações escandalosas, muitos são os que pensam que o poder disciplinar da Ordem está injustificadamente confiado a um sistema autogestionário, pelo qual a classe julga a classe, absolvendo-a, perdoando-se.

Arriscam-se os que assim pensam a darem origem a um sistema em que um dos núcleos centrais da autonomia estatutária da Ordem, o poder disciplinar, seja confiado então aos tribunais administrativos e com isso ocorra a funcionalização da Advocacia, que é o cerne do pensamento autoritário estadual e da arrogância política que em muitas mentes políticas campeia.

Mas é ainda o ambiente geral de descontentamento face ao funcionamento da Justiça, ao exercício da profissão e ao comportamento de muitos dos que dizem estar ao serviço da Ordem, que tem vindo a gerar um discurso radical e de agressividade verbal mais apto a incendiar paixões do que a resolver problemas e a que muitos colegas distraídos se ligam, encantados com o estilo, sem pensarem nos efeitos do conteúdo.

Face a esta situação urge a mobilização geral da classe em torno de um projecto credível de mudança.

Um dos pivots dessa mudança é o estrito respeito pela legalidade constitucional e pelos princípios basilares do Estado de Direito.

O Conselho Superior é um tribunal e um tribunal só é legítimo quando funciona em regime de separação de poderes face aos órgãos executivos que pode julgar. Tanto mais que os poderes do Conselho Superior desenvolvem-se em duas instâncias de recurso: em matéria disciplinar, quanto a todos os advogados, mas, também, em matéria executiva quanto às deliberações do Conselho Geral. Portanto afirmarmos a necessidade da separação face aos órgãos executivos que o Conselho pode julgar. Por isso a nossa lista é independente e autónoma.

Cabe ao Conselho Superior, através do seu Presidente, tal como ao Bastonário, zelar pelo cumprimento da legislação respeitante à Ordem dos Advogados, e esse poder de órgão fiscalizador só é viável se geneticamente quem fiscaliza não for irmão gémeo dos fiscalizados.

Trata-se de uma questão de credibilidade, de mudança de hábitos, trata-se de inovar face a atavismos culturais, ante a inércia e o desânimo.

A nossa lista traz pela primeira vez na História da Ordem colegas mais jovens do que o habitual, convocados para o desempenho da alta responsabilidade que compete ao Conselho Superior.

A seriedade, a isenção, a probidade não são apanágio dos velhos. Trata-se de uma nova aliança, entre experiência e juventude, a semente da necessária renovação, a confiança no futuro.

A nossa lista traz pela primeira vez na História da Ordem um número significativo de mulheres, que acorreram ao desempenho da função jurisdicional.

A Ordem, que se orgulha de ter sido um Advogado, o Dr. Francisco Salgado Zenha, enquanto ministro da Justiça, quem abriu as portas da magistratura judicial e do Ministério Público a mulheres, até ao 25 de Abril arredadas de tais cargos, tem de dar, também aqui, na sua orgânica interna, no seu tribunal, o exemplo que um seu ilustre membro deu para os tribunais comuns.

A nossa lista não pretende ser mais honesta, mais séria, mais honrada do que outras. Modestamente, apenas queremos ser os que, pelo modo como surgimos, não temos, logo na origem, nenhuma ligação ao poder executivo da Ordem, nenhuma ligação a qualquer poder.

Somos pessoas entre si diferentes, de natureza psicológica e de filosofia diversa, com um único ponto em comum: a vontade de mudar a Ordem dos Advogados a que nos orgulhamos de pertencer.

Não temos nenhum interesse a servir que nos limite o passo, nenhuma ambição de poder que nos amplie o gesto.

Não temos medo da adversidade nem dos que reagem à novidade tranquila com o reaccionarismo exaltado do insulto. Oxalá não tenhamos que ser nós o fiel da balança na nossa Ordem.

Coesos, disponíveis, preparámo-nos para enfrentar todas as emergências. Sermos livres, autónomos e independentes é não só a nossa moral, mas também a nossa força.

Se há corrupção a combater, que seja denunciada pelos que a insinuam e pelos que a calam. Não permitiremos que seja silenciado o mal denunciado, nem que, ao lançar-se a suspeita, se atire a pedra e se esconda a mão.

Em devido tempo formalizaremos a candidatura ora anunciada, apresentaremos o nosso manifesto eleitoral, o nosso compromisso para com os Advogados e com a Justiça.

Somos a primeira de todas as listas que, ao tornarmo-nos conhecidos como candidatura, trazemos a público todos os nomes que a integram. Connosco, os advogados sabem, desde já, quem somos.

domingo, 1 de julho de 2007

Pertinente

Depois deste governo ainda haverá estado social?